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A busca por conexões profundas parece estar perdendo espaço para o conforto das interações rápidas e filtradas das telas. Em uma geração onde tudo está ao alcance de um clique, o que deveria aproximar pode estar afastando — não só das pessoas, mas da própria capacidade de se relacionar de forma significativa. A vida digital se impôs como espaço dominante, e, com ela, vieram novas dinâmicas de afeto, prazer e companhia — nem sempre saudáveis. Para muitos jovens cristãos, o vazio que resta é preenchido com pornografia, redes sociais e medo de se comprometer com o outro. Mas a que custo?
Nos últimos anos, pesquisadores e profissionais da saúde mental têm apontado um fenômeno silencioso: jovens adultos, especialmente os mais conectados, estão cada vez mais solitários. E esse isolamento não é apenas circunstancial — ele tem raízes profundas na forma como a tecnologia reorganizou a maneira de viver e se relacionar.A falta de conexões profundas, entre outros fatores, está diretamente relacionada a esse uso excessivo de tecnologia e redes sociais”, observa a psicóloga Suzana Stürmer, da Igreja Presbiteriana Renovada – Família da Fé, de São José/SC. Segundo ela, essa realidade gera um conjunto de consequências graves. “Falta de habilidades socioemocionais, que tende a gerar ansiedade social, depressão, isolamento… e no isolamento, a fuga é para o digital, como um ciclo onde todas as coisas estão conectadas e se influenciam mutuamente”, disse.
Essa interdependência entre o emocional e o digital já é reconhecida inclusive por políticas públicas. O Brasil, por meio da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), passou a incorporar o desenvolvimento de competências socioemocionais na educação básica. Países como Reino Unido e Japão chegaram a criar um “Ministério da Solidão”, enquanto Alemanha e Portugal investem em políticas para promover a conexão social. A razão? O impacto da solidão não é só pessoal — é uma crise global com efeitos sobre a saúde pública e a economia.
Apesar do diagnóstico preocupante, a psicóloga Suzana destaca que o problema não está na internet em si. “As interações virtuais não são o problema nem a causa do distanciamento nos relacionamentos presenciais. A internet é uma ferramenta, nem boa nem ruim, apenas uma ferramenta”, destaca.
O risco, segundo ela, acontece quando o ambiente digital se transforma em refúgio para evitar os desafios dos encontros presenciais. “O perigo está nas interações virtuais se tornarem uma alternativa confortável para evitar os desafios das interações presenciais, quando o uso da internet é uma fuga do que quer que seja”, detalha.A pastora Patrícia Cunha, membro da Igreja Brasas Vivas, de Xaxim/SC, também observa esse desafio nos espaços eclesiásticos. Para ela, falta à igreja a coragem de enfrentar o isolamento afetivo dos jovens com propostas práticas e comunitárias. “A igreja pode criar espaços de socialização que facilitem essa conexão entre os jovens, para que se formem relacionamentos saudáveis entre eles. Pequenos grupos, grupos caseiros, podem acontecer retiros, e também encontros entre igrejas de uma mesma cidade”, explica.
Nesse cenário de isolamento e fuga, um outro dado chama atenção, é o consumo excessivo de pornografia entre os jovens. Pesquisas recentes, como a do Instituto Barna, realizada em 2024, revelam que a exposição à pornografia entre adolescentes e jovens adultos está em níveis historicamente altos — e essa prática impacta diretamente a saúde emocional e espiritual.
“A indústria da pornografia, em si, tem tantas consequências que pode ser comparada às ‘indústrias’ de drogas ilícitas”, enfatiza Suzana. Ela explica que esse tipo de conteúdo altera o funcionamento do cérebro, mexe com o sistema de recompensa e cria dependência comportamental. Além disso, “distorce a percepção da realidade e aumenta a necessidade de algo cada vez mais ‘perigoso’ porque quanto mais se usa, maior é a necessidade de mais estímulos”.
Os impactos não param aí. A profissional lembra que a pornografia também está ligada ao aumento de custos sociais e problemas de saúde pública, incluindo crimes e violência sexual, muitas vezes conectados à exploração e ao tráfico humano.
E, no plano pessoal e espiritual, o consumo de pornografia muitas vezes anda de mãos dadas com o medo do compromisso. “O medo do compromisso não está desconectado do consumo da pornografia. Pode ser um dos fatores, inclusive, dentre diversos outros, e ambas as situações afetam a formação de relacionamentos saudáveis”, explica.
Mesmo dentro das igrejas, muitos jovens vivem esse dilema de forma silenciosa. Mas o silêncio, segundo Suzana, é o que mais alimenta o ciclo de dor. “O caminho da destruição é ocultar o erro (Sl 32.1-5) e o caminho da restauração é pedir ajuda pra pessoa certa, no lugar certo, na hora certa, da forma certa”, ensina.
“Precisamos de uma liderança que saiba abordar essas questões com equilíbrio. Falar sobre namoro, casamento, de maneira saudável, sem peso excessivo e sem cobranças irreais”, disse ela defendendo que os líderes tratem com equilíbrio os temas ligados a afetividade e sexualidade.
Patrícia conclui com um alerta que vem da prática pastoral. “A gente já atendeu casos de homens, hoje adultos, que vivem traumatizados na área sexual porque a primeira experiência deles foi num prostíbulo, levado pelo próprio pai. Ou seja, ali já entrou a prostituição, ali já entrou a pornografia”, relata. O Evangelho oferece reconciliação. Mas, para vivê-la de forma concreta, será preciso coragem para sair do esconderijo digital e encarar, com honestidade, o outro — e a si mesmo. Talvez seja aí que começa a verdadeira revolução relacional dessa geração